retalhos cerzidos

"eles passarão... eu passarinho"

Textos


Resumo do amor, por Emil Cioran, em Nos cumes do desespero, tradução de Fernando Klabin — Editora Hedra Ltda.
O amor pela humanidade que brota do sofrimento se parece com a sabedoria que nasce da infelicidade. Em ambos os casos, as raízes são podres e a fonte, infectada. Só o amor natural e espontâneo pela humanidade, resultado de uma devoção franca e de um elã irresistível, pode fecundar também as almas dos ou­tros e comunicar uma intimidade calorosa e serena. Aquele que é gerado pelo sofrimento esconde tantas lágrimas e suspiros que dispersa raios de amargo brilho, em que pontos negros mancham a pureza do amor. É necessário demasiada renúncia, demasiado suplício e demasiada inquietude para que esse amor deixe de ser uma indulgência infinita. Perdoamos tudo, admitimos tudo, jus­tificamos tudo. Mas e o amor? Como ainda amar, se não estamos mais ligados a nada? O amor pela humanidade por sofrimento é o vácuo da alma humana entre Tudo e Nada, assim como, numa alma de amores fracassados, só o dom-juanismo ainda tem sen­tido. No Cristianismo não existe amor, mas apenas indulgência. Se houvessem retirado da cruz antes de entrar definitivamente no Nada aquele que se considerou o redentor do universo, ele não teria tido nem mesmo essa indulgência, que é mais uma alusão ao amor do que amor.
 Amor por sofrimento? Ele pode ser ilimitadamente grande, mas as flores desse amor não se enraízam menos em veneno.
Emil Cioran
Enviado por Germino da Terra em 11/12/2012
Alterado em 14/12/2012
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